Há pouco tempo eu retomei os trabalhos na elaboração de um livro que relata algumas experiências vividas naquela viagem. São histórias relacionadas não só à própria aventura, mas também sobre alguns livramentos que passei durante a viagem, se peguei medo? Não, peguei gosto, adquiri uma experiência fantástica e comecei a enxergar a vida de uma forma diferente. Depois dessa viagem, já realizei outra para Chile, Argentina, Bolívia e Peru, estou com San Lorenzo -PY agendada e já estou com programação para 2016 e 2017.
Aqui eu vou relatar um pequeno resumo do meu último dia de viagem. Eu havia me hospedado em Posadas (ARG), estava a aproximadamente 900 km de casa. Cheguei na cidade por volta das 21h na noite anterior, estava com pouco dinheiro (peso argentino) no bolso, não era suficiente para pagar um hotel, era quase 11 h e eu ainda procurava um lugar para dormir. Parei num hotel e faltava em torno de R$ 30,00 (valor aproximado em pesos argentinos que eu tinha) para completar a diária, eles não aceitavam nosso real e então tentei negociar com o funcionário do hotel, pedi um desconto e disse que não precisa me dar o dasayuno pela manhã, ele não aceitou e então disse a ele que não tinha como pagar e fui me retirando. Como era tarde da noite e provavelmente ele estava com o hotel vazio, resolveu mudar de ideia e acabou aceitando o que eu tinha no bolso.
Na manhã seguinte comecei a preparar a Midi para seguir viagem, logo então eu fui acertar o meu pernoite e despedir do funcionário do hotel. Ele já tinha ido embora, havia um senhor em seu lugar e já estava ciente da minha história, ao me despedir dele, ele me perguntou seu eu não iria tomar o desayuno, então eu mencionei que tinha negociado no preço, eram quase 7 horas da manhã e ele me chamou até a cozinha, sentamos à mesa e ele me serviu um belo café, na hora quase chorei, pois estava sem nenhum puto no bolso e ainda tinha que achar postos de gasolina que aceitassem a tarjeta, por sorte o tanque da Midi estava quase completo
Sai de Posadas rumo a Bernardo de Irigoyen, entrando no Brasil pela cidade de Barracão, foi indicação de um amigo, disse que era um caminho mais curto, e realmente era. Nesse trecho da viagem eu tive dificuldade no abastecimento, os postos não aceitavam a tarjeta, consegui abastecer em reais com uma conversão um pouco mais alta, no final eu paguei uns R$ 4,00 a mais, porém, devido o sufoco este valor foi irrisório.
Um pouco antes de chegar em Bernardo de Irigoyen havia uma manifestação de campesinos bloqueando as estradas, seriam o nosso MST, deixei a moto perto de uma viatura da Gendarmeria Argentina e fui conversar com os policiais, eles me disseram que aquela manifestação iria até 12:00h , então ficamos ali conversando sob um sol muito forte (estava próximo de Foz do Iguaçu).
Conversa vai, conversa vem, o policial quis olhar a Midi, estava admirado com ela, fiquei um pouco com receio, pois o pneu estava para lá de careca. Então fomos até a moto, naquele momento até eu fui surpreendido, os arames começavam a aparecer e ele me chamou a atenção para isso. Eu menti a ele dizendo que meu tio estava me aguardando em Barracão com um pneu novo, ele apenas me disse para tocar o restante da viagem até a divisa com mais cuidado e permitiu que eu seguisse.
Chegando em Barracão fui até a única oficina de moto na cidade, não havia o pneu, aliás, esse foi um dos grandes problemas da Midinight no Brasil, a fábrica lançou a moto com pneus que não haviam no mercado naquela época, o comum era aguardar uns 15 dias para conseguir um. Continuei viajando lentamente, passei por Pato Branco e também não havia, quando cheguei em Guarapuava o comércio já estava fechando e já era quase noite.
Resolvi seguir daquele jeito para Curitiba, e então outro problema apareceu, a correia da relação da Midi desgastou num espaço de 10 centímetros, os "dentes" estavam soltos e quando aquele pedaço de correia passava pelo pinhão a moto dava uma falhada no ritmo e eu ainda esta um pouco mais de 200 km de Curitiba, o detalhe é que a falha ocorria e quando estava em marchas reduzidas, em velocidade mais alta ela andava bem. O negócio foi seguir viagem e alta velocidade e rezando a Deus para que meu pneu traseiro não estourasse, quando havia necessidade de ultrapassar um carro mais lento eu já ficava pronto para jogar a moto pro lado oposto caso acontece algo com o pneu.
Cheguei em Curitiba por volta das 22h, cansado, exausto, tomei um banho e cai na cama. Somente no dia seguinte eu fui ver o estado da Midi, ao mesmo tempo que eu me chamava de irresponsável, eu me admirava pela loucura e coragem que foi esse trecho da viagem. Do jeito que a moto chegou ela foi de carretinha para a Curitiba Moto Store, ficou exposta uma semana na loja antes de começar as manutenções. e o pneu da Midi me serve como mesinha de centro da sala de estar.
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